25 novembro, 2006

Das Guerras Públicas III

Eis a história que não se passou em Santo Amaro, mas perto, onde uma manhã de neblina e muito sono deu origem à sequência de acontecimentos para os quais tentámos, nas breves linhas que passaram, preparar o leitor.

Um dia (que ficou conhecido na história do lugar como “Dia da Invasão”) Dona Juliana acordou com uma miserabilíssima disposição. Ela teve de dormir por debaixo de um lixorioso Volkswagen Dobrowolfsky que encontrou na floresta onde ela se perdera no dia anterior, dia da caça aos P.A.s (tornou-se desporto nacional correr com uma bazuca atrás de P.A.s e mandar-lhes tiros). Nesta manhã, nada parecia correr bem. Encharcada de chuva nocturna, ela andou pelas ruas onde foi tratada como uma hilota e os passantes com hilariedade cuspiam-lhe e apalpavam-na. Começou a correr ainda protegendo o quadril dos apalpões. Finalmente, livre de tudo e sozinha, subiu a um montículo monte semeado de morangos. Daí ela pôde orientar-se, achando, por fim, o mais curto caminho para casa, isto é, o castelo, onde ela foi sagradissimamente entruvernada pelos criados do sítio. Mesmo depois de lavada e vestida, via-se a raiva como relâmpagos encarnados remoar desresgatoriamente o ar do quarto real onde ela costumava raivar.

Mas a raiva nunca forai tão grande como nesse dia. Tinha sido humilhada, descongrisada. As paredes do castelo vibraram quando ela teve a satanística ideia de mobilizar todas as suas tropas contra o inimigo Dom Eduardo. Este, com a calma de uma criança, nessa manhã dedicou-se a ler as cartas de namoro que tinha recebido. Esta boa disposição foi de algum modo fatal.

Ouviu, inesperadamente, o som da trombeta Juliana, horrendo, fero, ingente e temeroso; ouviu-o o monte Artabro (Sintra) e Guadiana (afluente insignificante do Espermatozóide). Atrás tornou as ondas de medroso. Correu ao mar o Tejo duvidoso (alegre Tejo? Agora já nem tanto, parecia mais preocupado). E as mães que o som terribil escuitaram aos peitos os seus filhinhos apertaram.

As tropas de Dom Eduardo Locomotiva, enfraquecidas por falta de droga e exercício caíam na batalha como água em dia de chuva. Os habitantes da terra atacada mobilizaram-se com garfos, facas, canas, raquetes, granadas, tanques, preservativos, lança-chamas e máquinas fotográficas. A temurelosifoskalosa batalha tomou o seu curso.

Completamente cercados por míriades de soldados, os habitantes de Caxias refugiaram-se no convento dos Salusianos, ordem religiosa protegida por Dom Eduardo. As legiões julianas dispuseram-se em torno do convento, utilizando a célebre táctica da coroa circular. A trompa de Dona Juliana soou três vezes - três vezes soou, tenebrosa e profunda. E, à roda do convento, as legiões marcharam três vezes, três vezes marcharam a gritar e pararam. O ar estava pesado e mudo. Os dois exércitos fitavam-se ameaçadoramente. À luz do luar brilhavam lâminas, elmos e cotas de malha. Um raio cortou o céu nublano.

- Por S. Julião !
- Por D. Bosco !

Um raio cortou o céu nublado.

D. Juliana, na sua torre no castelo de S. Julião, espreguiçou-se no leito de seda.

- Espero que os meus tipos se estejam a sair bem ... - disse ensonada e bocejou.

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